A Criatura da Névoa


Os olhos da criatura percorreram o local a sua volta, suas pupilas negro-azuladas passando por todo o perímetro abaixo de onde se encontrava. Dali — entre uma fenda na rocha cinzenta — podia visualizar a estrada que passava por entre a montanha, serpenteado ao lado do pequeno riacho que trabalhava as pedras escorregadias e lodosas, traçando um leito cheio de curvas e irregulares. Uma bruma envolvia todo o lugar, era densa e grudava na pele, deixando-a não só ainda mais fria e com aspecto mais esbranquiçado, como também húmida; a nevoa parecia se intrincar na pele e o frio chegava lhe até os ossos.
A coisa não tinha companhia tempos, pois a passagem era pouco utilizada e raramente pessoas arriscavam seguir por aquele caminho. Lendas sussurradas por entre os povos nômades da região diziam que algum ser, um tipo de mal, se apoderara do curso das águas, amaldiçoando qualquer um que por ali tivesse a coragem — ou a insanidade — de passar. Isso lhe dificultava a sobrevivência. A falta de alimento deixava lhe cada vez mais fraco, e as baixas temperaturas não contribuíam em nada para seu estado. Todavia, aquele era um dia de sorte.
Ao longe avistou um ponto amarronzado se movendo por entre os arbustos. A capa cobria-lhe o rosto e boa parte do corpo. Apenas botas negras e a barra de uma calça de couro puído e desgastados pelo uso eram vistas entre as largas passadas. O homem parecia ter pressa, e apesar de se manter alerta aos pequenos barulhos a sua volta não estava completamente atento, como se o ímpeto de atravessar a passagem o mais rápido possível diminuíssem seus instintos.
A criatura abriu a boca que se firmou num sorriso, ou o mais próximo disso que suas feições animalescas poderiam chegar. À medida que sua presa se aproximava podia sentir o cheiro de sangue; talvez ele estivesse ferido, mas aquilo não importava. O aroma só lhe atiçava ainda mais a fome de meses sem qualquer tipo de alimento. Os pequenos roedores ou morcegos que encontrava não poderiam ser classificados como uma refeição, e depois de algum tempo até mesmo esses eram considerados “regalias” quando encontrados. Como que confirmando a ânsia por carne fresca um ronco exigente ecoou da barriga da coisa. Não esperaria muito mais. O corpo acinzentado se retesou, aguardando o momento exato em que atacaria.
 O leito do riacho se alargava perto da fenda em que a criatura se escondia, só havia uma forma de atravessar. O homem teria de se esgueirar pela parede ou cairia nas aguas quase congeladas. Notando isso ele parou, observou atentamente procurando pelos perigos que as rochas poderiam guardar, contudo não enxergou nada. Sua visão não era suficientemente boa para encontrar a coisa, Deu alguns passos e quando estava quase do outro lado gritou.
A criatura surgiu como se conjurada do inferno acima dele, atacou-o direto no pescoço, a veia pulsante que clamara por suas presas. As feições da vítima eram de estremo pânico e demostravam o horror que sentia ao encarar uma morte eminente, e sem seguida, o grito sessou. O homem que até então se debatia lutando por sua própria vida caiu flácido sob as garras da criatura que se emborcou sobre o corpo. As presas afiadas e garras sujando-se de sangue enquanto devorava com uma grosseria inumana o que já não passava de um cadáver dilacerado.

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